domingo, 17 de janeiro de 2010

Ric Hochet - um herói da banda desenhada

in PÚBLICO - 9 de Janeiro 2010-01-14
citado em http://kuentro.blogspot.com

«TIBET (1931-2010)
UM CLÁSSICO NA SOMBRA DOS MESTRES


Carlos Pessoa



A história da banda desenhada não lhe concede o mesmo lugar destacado que ocupam Hergé, Jacobs ou Franquin. Mas foi um dos pilares da revista Tintin e um autor muito popular.
Setenta e seis aventuras mais tarde, o jornalista-detective Ric Hochet enfrenta o seu maior desafio: sobreviver a Tibet, o homem que concebeu o herói em 1955 e o desenhou até à morte, no dia 3 de Janeiro, 30 minutos depois da meia-noite. Tinha 78 anos.

Tibet, nascido em Marselha, é o nome artístico de Gilbert Gascard, "dado" por um irmão mais velho que pronunciava mais facilmente Ti-bet do que Gilbert... Deixa atrás de si uma longa carreira na BD, que começou nos Estúdios Disney de Bruxelas, no final dos anos 1940 - é aí que conhece o argumentista Duchâteau, com quem irá manter uma longa parceria.

Não é um nome de primeira grandeza - pelo menos com a projecção de Hergé, Jacobs, Morris, Franquin e outros monstros sagrados da BD europeia de filiação franco-belga. Mas está longe de ser um mero figurante. A sua extensa biografia assim o demonstra.
Em 1951 entra para o quadro da revista Tintin como maquetista e ilustrador. Em 1953, surgem na revista Ons Volkske e na equivalente francófona Chez Nous Júnior as aventuras de Chick Bill, com desenho e argumento de Tibet, depois transferidas para o Tintin.

Dois anos mais tarde lança com Duchâteau a série policial Ric Hochet. Nos anos seguintes, está envolvido no desenvolvimento de Globul le Martien, Alphonse (ambos em 1956, este último com Goscinny) e Mouminet (1957, com Greg). Entre 1962 e 1967, desenha a série 3 A (argumento de Michel Vasseur, aliás Duchâteau).
Antes, durante e depois, haverá uma presença constante das aventuras das suas duas séries mais conhecidas - Chick Bill (60 álbuns) e Ric Hochet (76 álbuns e o último, ainda desenhado por Tibet, com saída marcada para Março). São dois sucessos de público com milhões de álbuns vendidos.



Um senhor encantador

O reconhecimento é justíssimo: Chick Bill é "uma comédia à maneira de Laurel & Hardy aplicada ao western", comenta para o P2 Didier Pasamonik, editor do site francês Actua-BD. A segunda é, diz, "o arquétipo do Whodunit na BD, esse género policial denominado light suspense de que fazem parte Agatha Christie ou John Dickson Carr na literatura".

Benoît Peeters, também autor de BD e estudioso dos quadradinhos, confessou ao P2 que "conhecia mal a obra", mas recorda o homem como "um senhor encantador". Tibet foi, além disso, um cultor aplicado da famosa linha clara, "absolutamente pessoal, menos académica do que a do criador de Tintin", sublinha Patrick Gaumer, autor de uma monografia sobre o artista e do Dictionnaire Mondial de la BD.

Considera "essencial" a contribuição de Tibet para a história da BD clássica franco-belga. "Durante toda a sua vida bater-se-á pelo reconhecimento do estatuto de autor", disse ao P2.

Tanto Laurent Mélikian, jornalista especializado em banda desenhada, como Gilles Ratier, secretário-geral da Associação dos Críticos e Jornalistas de BD (França), coincidem na dimensão "popular" da obra de Tibet. "Contribuiu para manter o estilo linha clara", responde Mélikian. "O seu traço permitiu popularizar a BD made in revista Tintin", acrescenta Ratier. Pasamonik, por seu lado, considera "Tibet um dos esteios da BD franco-belga": "A sua série Ric Hochet foi durante muito tempo uma das preferidas da revista Tintin. Numa das últimas sondagens, continua a registar uma notoriedade de 80 por cento entre os belgas."

A opinião de Geraldes Lino, divulgador de BD e editor de fanzines, vai no mesmo sentido: "Ele fez mais coisas mas, para mim, Tibet é Ric Hochet, uma série em registo policial que não é vulgar na BD europeia." Amplamente divulgada pela edição portuguesa da revista Tintin, esta série "era muito cativante para os leitores de 16-18 anos da época", dando a conhecer um criador "com um trabalho correcto, eficiente e agradável de ler".

É tudo isto que leva a maioria dos críticos ouvidos pelo P2 a rejeitarem a visão de Tibet como um autor de segunda linha. "É a segunda geração de autores clássicos", defende Didier Pasamonik. "É um dos grandes da BD franco-belga, mesmo se o seu contributo (e o seu talento) estavam nitidamente abaixo da envergadura de Hergé, Jacobs, Morris ou Cuvelier", diz Gilles Ratier. Patrick Gaumer também não concorda com a menorização de Tibet: "Seduziu um público muito amplo e deixa uma marca indelével no coração de muitos leitores."»

E na nossa Biblioteca?
A nossa BE/CRE possui, à disposição dos seus utentes, um álbum de Ric Hochet, editado pelo jornal Público.



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